Tu és Aquele!
Sou uma cotovia! Uma irremediável madrugadora, que embora goste muito do pôr-do-sol, não o troco pela luz, pelo silêncio e pela experiência do sagrado e de esperança que traz o amanhecer. Hoje, bem cedo, observava três alvéolas-brancas a brincar no límpido céu azul e lembrei-me desta frase, que é atribuída a Albert Einstein:
"Existem duas formas de viver a vida: uma é como se nada fosse um milagre, a outra é como se tudo fosse um milagre."
Refletindo sobre a palavra milagre, que no dicionário é definido como algo ou um acontecimento extraordinário, que por estar além da nossa capacidade ou controlo atribuímos a sua autoria ao divino, consigo ver como todo o amanhecer é um grande milagre, como toda vida e o mundo são um extraordinário milagre.
Relembro os meus primeiros contactos com o vedanta e do sentimento de uma verdade sentida mas não compreendida quando ouvia o paradoxo: "Tat Tvam Asi".
Em devanágari Asi é o verbo e significa és (do verbo ser), Tvam significa tu e Tat significa Aquele (aquele que é o todo, a causa do universo, Deus, enquanto a força, o princípio inteligente que criou tudo isto). Ou seja, "Tu és Aquele!", na essência todos somos o sagrado, o divino. Deus está em tudo e em todos, pois ele é a matéria e a causa da criação.
Vivo muitas vezes com a ideia do divino como algo que me é externo, e por consequência vejo-me como um ser separado, focada demasiado nas diferenças e no que me separa dos outros e do mundo. Condeno-me a sentimentos de solidão, incompletude e de carência/ausência de algo, por ignorar que sou/somos sagrados, que sou/somos um extraordinário milagre. E sei que posso andar às escuras a vida inteira a tentar iluminar um escuro que nunca existiu.
Hoje comemora-se, no calendário cristão, o dia de todos os santos, daquelas pessoas distintas, únicas e heroicas que souberam ligar-se ao divino que são. E saboreio as palavras de Tolentino de Mendonça*, que diz que a santidade, o divino é-nos dado todos os dias, pois a humanidade do homem é o divino de Deus. E é no pequeno, no quotidiano, no usual, nas nossas pobrezas, fragilidades, aflições, no que somos e fazemos, na vulgaríssima, humilde, monótona e pequena história que dia a dia protagonizamos que "podemos ligar a Terra e o Céu."
Rita
Mendonça, Tolentino. "Só há uma infelicidade, que é a de não sermos santos." (https://www.imissio.net/v2/liturgia-diaria/tolentino-mendonca-so-ha-uma-infelicidade-que-e-a-de-nao-sermos-santos:3775/) Vista em: 01/11/2024
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